Pudemos assistir ontem no STF o julgamento final do inquérito nº 2280, no qual se discutia o recebimento ou rejeição da denúncia do Ministério Público Federal contra o Senador, e ex-governador de Minas Gerais, Eduardo Azeredo (PSDB-MG), pelos crimes de lavagem de dinheiro e peculato.
O então indiciado, e agora réu, é acusado de envolvimento no chamado “Mensalão Mineiro”, esquema de caixa dois durante sua campanha para reeleição ao governo de Minas Gerais – em 1998 – envolvendo a utilização do dinheiro de estatais mineiras e “grandes personalidades” políticas, como o publicitário do Mensalão Federal Marcos Valério.
Na sessão anterior o Ministro Dias Toffoli pedira vista dos autos, o relator Joaquim Barbosa já havia se manifestado pelo recebimento da denúncia. Toffoli pediu vista por ter dúvidas quanto a um recibo utilizado como prova contra Eduardo Azeredo. Esse recibo, autenticado e no valor de R$4,5 milhões, teria sido emitido para Azeredo pelo grupo de Marcos Valério.
A sessão plenária de ontem se iniciou então com o voto de Toffoli, mais recente membro da Corte, cuja indicação foi bastante questionada, especialmente por já ter sido advogado do PT.
Muito me impressionou o esmero com que Toffoli defendeu seu posicionamento: pela rejeição da denúncia. Em seu voto, o Ministro questionou a legitimidade do recibo e asseverou que não se encontra na denúncia qualquer fato imputado diretamente ao acusado – sendo que o direito brasileiro não admite imputação objetiva e denúncias genéricas – razões pelas quais a denúncia contra o Senador merecia ser rejeitada.
Em vários momentos o Relator questionou os pontos trazidos por Toffoli, dizendo que aquele não era o momento para tais discussões, que ele estava sendo “impertinente” e não havia lido os autos e seu voto (a resposta do Ministro divergente não foi muito simpática, mas isso não vem ao caso).
De fato, como foi observado posteriormente pelos Ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio, o recebimento da denúncia não pode ser uma simples “carimbada”, um ato aleatório baseado em débeis suposições. Trata-se de um momento importantíssimo da persecução penal, que exige fundamentação, indícios de autoria e de materialidade. INDÍCIOS.
Entendo que no processo penal prevalece o princípio do in dubio pro reu. Ocorre que, no recebimento da denúncia – momento a partir do qual o réu terá todo o decorrer de um processo para o exercício do contraditório e da ampla defesa – não vejo por que não prevalecer o in dubio pro societate.
No caso em questão, a denúncia contém acusações que afetam diretamente o interesse e o patrimônio públicos. Ressalte-se ainda, que as quantias envolvidas são suficientemente elevadas para que se faça uma valoração favorável à sociedade.
Ademais, encerrado o voto de Toffoli, o Relator e outros Ministros debateram outros elementos dos autos – além do recibo – que foram por eles considerados para justificar o recebimento, evidenciando que havia indícios mais que robustos para o início da ação penal. Afirmaram ainda que várias denúncias já foram recebidas com base em indícios “muito mais tênues” do que aqueles contidos nos autos em questão.
Fatos como SETENTA E DUAS ligações telefônicas de Marcos Valério para o celular pessoal de Azeredo, antes do início dos escândalos de 2005, foram mencionados por Joaquim Barbosa. É no mínimo estranho que, verificado tamanho contato entre ambos, o acusado não tenha conhecimento de nada, ainda mais em se tratando de tão vultosas operações e quantias.
O resultado final, felizmente, foi pelo recebimento da denúncia. Como o Ministro Carlos Ayres Britto enfatizou o “caixa 2 é uma desgraça no âmbito dos costumes eleitorais”, e por isso todos os possíveis envolvidos devem ser parte na ação penal.
Certamente cabe a aplicação do in dubio pro reu ao final do processo, momento em que não se pode perder de vista a presunção de inocência, mas antes disso a sociedade merece ver o esclarecimento completo dos fatos.
Fico feliz que a denúncia tenha sido recebida, mas me preocupa o fato de que três dos oito ministros presentes tenham votado pela rejeição (Toffoli, Eros Grau e Gilmar Mendes). Também não posso deixar de observar que certos trechos do voto de Toffoli “confundiam-se” com defesa do acusado.
Fica meu desabafo.
Capivara gigante
ResponderExcluirOs veículos de comunicação ganharam uma ótima oportunidade para provar aos céticos que as acusações de golpismo eram exageradas. Basta dedicar à oposição a mesma virulência investigativa (e amiúde caluniosa) que reservou aos petistas nos idos de 2005.
O noticiário oferece três “mensalões” muito promissores, cheios de novidades inexploradas, que compartilham entre si, no mínimo, as tendências políticas de seus protagonistas: o de Eduardo Azeredo (PSDB), o da Camargo Corrêa e o do governador José Roberto Arruda.
Somando todos os esqueletos, constrói-se um enorme ossário com as cúpulas do PSDB e do DEM (PFL), uns pedaços de peemedebistas e tutano dos governos FHC para salgar o caldo. Se os escandólatras da imprensa democrática usarem seu espírito investigativo para expor os Freuds Godoys do momento, operam a grande revolução moralizante que tanto defenderam em seus editoriais inflamados.